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sexta-feira, 23 de julho de 2010

É tudo que nos resta


Ele me chamou quando eu ainda estava entre os amigos. Falou baixo. Disse que queria conversar comigo. Não vi a minha expressão naquele momento, mas tenho certeza que deixei nela bem claro o quanto eu consideraria aquela conversa inútil, afinal, depois de tanto tempo (para mim, já havia passado muito tempo) não havia mais nada a dizer, a conversar, a reclamar, a discutir. Nada. O que existiu entre nós havia acabado, e tive a impressão de que para ele ainda restavam algumas esperanças.

- Acho que temos muito o que esclarecer - disse-me ele assim que chegamos em um canto onde estávamos a sós e ninguém podia nos ouvir.

Não, a minha resposta não foi ensaiada. Foi simplesmente o que eu queria dizer. Ele abriu a boca para falar mais algumas coisas, com certeza inutilidades. Dizer que a gente ainda podia tentar, que ainda havia chances para sermos felizes juntos, que bastava eu dar mais uma chance, que eu agi por impulso e que tomei iniciativas erradas... Coisas que ele já havia me dito, pouco antes de tudo acabar.

Eu o interrompi. Ele me olhou como se esperasse algo positivo, mas eu já sabia o que eu queria. O seu olhar já não me encantava mais, o seu cheiro tornou-se comum para mim, suas expressões não me diziam nada mais do que o que aparentavam, e isso me deixava feliz. Realmente acabou para mim.

- Escute, ouça. -E me calei por um minuto.

Ele esperou eu falar algo, mas perdeu a paciência e disse:

- O que significa isso?

- Isso é o que nos restou - falei.

- O quê?! - Ele perguntou.

- O silêncio.


MarinaV.

sexta-feira, 9 de julho de 2010

Depressão




Ela é uma mulher sombria. Se pudesse ter cor, acho que não teria. Ela é a mistura de toda a beleza com toda a tristeza, de toda a indecisão com toda a emoção. E quando ela chega, ela toma e domina tudo.




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Meus olhos estão abertos. Me sinto caída ao chão, mas acho que estou deitada na cama. Não importa, nada mais importa. Queria chorar, mas minhas lágrimas esgotaram. Ela me esgotou. Não tenho motivações, não tenho razões, tenho pressa de perder o sopro vital. A vida... É dura e difícil para mim. Talvez nasci para isso. Para morrer com medo dos desafios.


Eu sinto ela. Ela é esta escuridão aqui, ao meu lado, que deita a minha cabeça nas suas pernas, que passa as suas mãos em meus cabelos, que parece me acalentar, mas que puxa para um precipício. Ela é este líquido sobre o qual eu me deito. Eu sinto ele, mas ele parece não molhar. Ele é preto, um preto escuro e sombrio, como se juntasse todo o mal em um frasco e o derramasse aqui. Ela é o ar que eu respiro. Este maldito ar pesado, que entra dando socos no peito, que dói de ser respirado.


Ela é cada lágrima que desce agora voluntariamente do meu rosto, sem ordens ou motivos. Ela é minha consciência insana, minha consciência que ela toma e domina, que ela controla e manipula sem muito esforço. E ela sussurra ao meu ouvido, me chama de fraca, me chama de perdedora, me chama de inútil, me chama de morta. E eu acredito.


Não sei se ela é boa ou ruim. Ela simplesmente existe e está aqui. Dentro de mim. Mas não consigo arrancá-la.




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Eu sou aquilo que você acha que quer ser. Sou todos os motivos do seu sofrer, e talvez todos os motivos do que você queria fazer. Não tenho motivos para chegar, mas posso ter para sair. Posso te acalentar, posso te fazer sentir-se melhor, basta você me deixar te seguir. Por um momento, infímo e distante, conseguirei te fazer feliz.


E esse momento dura apenas sua morte.




MarinaV.

quinta-feira, 8 de julho de 2010

O começo do fim


Não se cale
nem me deixe soltando injúrias sozinha.
Não finja que não se importa
nem finja não se importar com o que digo.

Me obrigo a dizer sim para meu ego
do que me passar por tola batendo na sua porta.
Não sou sua maleável criancinha
para escutar suas reclamações de "fale, apenas fale"

Que se dane seus beijos,
seus abraços e seus cheiros.
Que se dane as frases feitas,
os sentimentos vividos e a dor futura.

Desamarro nosso laço
sem empreitas ou suspeitas.
Apenas esqueço teus fios louros
e meus sonhos e desejos desfeitos.

Deixo para trás essa alegoria,
essa maldita teoria
de que amar alguém é tudo na vida.

Te amar foi minha estadia
nesse mundo onde um dia a gente ria
e estar com você não passava de alegria.


MarinaV.

Triste fim de Clara


Esqueça. Esqueça. ESQUEÇA! Tire da sua inútil cabeça, tire sua inútil! Você não passa se uma vagabunda... Isso mesmo. Uma puta desqualificada, que apenas se ilude em cima de um homem que lhe jura amor, mas que no fundo apenas se contenta em te pagar em troca da ilusão de um carinho. Não derrabe lágrimas inútil, sua imbecil!! Não chore suas lágrimas indignas, suas lágrimas de um passado tão distante e mal vivido. Tudo é culpa sua, Clara, culpa sua...

Aonde me vejo agora? Tenho uma Ferrari para cada dia da semana, compro quadros caríssimos para enfeitar as paredes inúteis desse chiqueiro em que vivo. Compro compulsivamente, gastando o dinheiro deste otário que agora deita ao meu lado, sobe essa sua mão imunda de dinheiro pelas minhas pernas, me chama de "gostosa" e acha que eu vejo vantagem. Que imbecil! Mas eu aceito, passe essa sua mão enriquecida aonde quiser, sua puta está aqui se oferecendo. Suba e desça sua língua pelo meu corpo, não me importo. O amor se foi pra mim. O meu amor... se foi... pra mim...

Aonde me vejo agora? Antes, apenas uma adolescente como outra qualquer, se não fosse pela minha arrogância e egoísmo, como outra qualquer... Indo para seu primeiro dia de aula da universidade, aonde conheci ele. O amor...Ele é incrível. Se esbarra com a gente por acaso na vida, nos oferece oportunidades de cedermos o nosso eu para vivê-lo, e eu, esta puta imbecil, joguei todas fora. Estou pagando minha conta agora. Vamos, ordinário, me morda, pegue nas minhas pernas e sinta cada milímetro do meu corpo, enquanto eu ignoro a existência de cada milímetro do seu.

Aonde me vejo agora? Cadê aqueles olhos castanhos que me motivavam? Aqueles braços que me apertavam contra seu corpo, me fazendo sentir seu perfume maravilhoso? Perdi meu colo de consolo, perdi meu olhar de motivação, perdi o único beijo que soube realmente me tocar, perdi o único amor que soube realmente me amar. Miserável! Me jogue nessa sua cama inútil, me leve ao chão! Isso mesmo, me chame de puta, me bata! Eu pago a sentença, eu aceito a sentença.

Aonde me vejo agora, meu amor? Quem me dera se desse tempo de voltar atrás... E como eu iria gostar. Sentir de novo a brisa do mar naquela praia, te beijar e rolar na areia como naquele dia, me lembrar das loucuras de amor que você fazia, que eu movia apenas para preservar meu ego. Ele não tinha lá boas condições financeiras, e eu o rebaixava por isso. Julgava-o incapaz de me dar presentes caros, e quando menos esperava, lá estava meu colar de pérolas, meus brincos de diamantes, os vestidos luxuosos, as bolsas... Dinheiro... Sinto o cheiro de dinheiro ao lado desse velho que se deita perto de mim, que beija meu rosto e diz que eu "mandei bem"... E odeio o cheiro.

Aonde me vejo agora? Me chamo Clara. Clarice Oliveira Dantas. Aprendi francês, inglês e espanhol. Fui mimada o suficiente para ser burra, fui idiota o bastante para fazê-lo sofrer. Mas ele me chamava de Clara, porque eu era "límpida, leve e distante", como as claras nuvens que ficam no céu. Isso me faz rir... Não de alegria, de ver graça, mas de desgosto... Não havia ninguém mais límpido que ele, mais leve que ele, e tão perto de mim do que ele... Que ironia. Cuspi na minha felicidade. Joguei tudo para o alto e atirei no escuro. E o tiro acertou o alvo. "Clara Branca. Clarice Oliveira Dantas Branco. Você gostaria de ter meu nome no seu?" Ah, meu bem... Como eu gostaria de voltar...

Aonde me vejo agora? Ao lado de um idiota, derrabando lágrimas que ele julga de prazer, mas que são de profunda dor. Quero partir dessa vida, eu tenho péssimas lembranças! O que eu fiz, o que eu fiz?! Destruí minha alegria, meu único amor, minha razão de vida. Eu quero a dor da morte, eu mereço tal dor. Não, mereço dor pior. Tenho que permanecer viva, continuar sendo uma miserável qualquer, a puta deste ricaço, aturando as noites com ele ao lado, tirando a minha roupa como se eu fosse prêmio e deitando nessa cama, nesta maldita cama!!!

Apague, delete, destrua essas lembranças! Esquece aquele dia, esquece a maldita arma, esquece a brincadeira!! Esquece imbecil!! "Você gosta de brincar com fogo, minha Clara?" Sai da minha cabeça perfume dominador, sai do peito dor enorme! Não me derrube, não deixe as lágrimas me deixarem no soluço... Não posso sentir dor por isso... Não posso... "Gosto do fogo, posso disparar o tiro?" Saiam da minha cabeça risos idiotas, sai da minha cabeça som de bala, sai, sai, SAI!!!

É triste admitir os erros da vida. E este é o meu. Disparo agora este tiro na minha cabeça pensando na dor do peito dele ao sangrar aquele sangue vermelho, vermelho como a nossa paixão nas noites de verão, vermelho como as minhas lágrimas que agora escorrem.

Aonde me vejo agora? Caindo, como se cada segundo da queda demorasse uma hora, chego ao chão e sinto, pelo a última vez, o gosto... Daquele beijo... Da praia... Verão.


MarinaV.


Nota: Texto baseado no conto de Lygia Fagundes Telles, Apenas um saxofone. O nome Clara veio do livro Clara dos Anjos, de Lima Barreto. O sobrenome Oliveira e Dantas pertencem à duas amigas minhas, Carol e Bruna, respectivamente.

Prazer, sou Brasileiro



Sim, sou brasileiro. Aquele lá, que passa nas propagandos governamentais sendo descrito como um lutador, o que nunca desiste. O que faz tudo para melhorar a nação.

Que dane-se o vocabulário o culto, as mentiras e falsidades da ideologia televisiva das propagandas. Quanta idiotice afirmar isso!

Brasileiro somos nós. Aqueles que sempre dão um maravilhoso "jeitinho" em tudo, aqueles que vivem fugindo às regras. Que geram os enormes problemas do país e sempre culpam os governantes. Sim, somos estes brasileiros.

Aquele que fura fila e fala do mensalão, aquele que prende o sujeito mal vestido das ruas e deixa os de terno soltos, aquele que critica tudo mas não percebe os outros dedos que apontam para ele próprio, aquele que não sai em paseatas, que não luta pelos seus direitos, aquele que se conforta com a sua situação medíocre de viver. O mediano é bom para o brasileiro. Tudo na vagabundagem é bom para o brasileiro.

Sim, nos somos estes miseráveis. Sabemos apontar, criticar e mostrar o errado. Mas por que não concertamos os nossos erros? Ou afinal, somos o espelho da perfeição?

Aponto de cabeça erguida, sem medo de críticas e de batalhas: o problema do Brasil é este. Nós, medíocres brasileiros.

Prazer, sou Brasileiro. E este é o meu jeito. Acabo com o meu país e ainda tiro proveito. Prazer, cumprimentem à mim. Mereço o grande mérito de medíocre.





MarinaV.

terça-feira, 6 de julho de 2010

Ela sofreu


Nasceu como uma criança normal. Senão pelo fato de ter nascido de 7 meses. Lutou um pouco para sobreviver, afinal, na época a medicina não era tão avançada e os cuidados para ela sobreviver foram tomados na própria casa. Ela cresceu como outra criança qualquer, apesar da família ter passado por dificuldades e dela ter que ajudar a mãe no trabalho. Ela sabia disso. E não se arrepende. Já disse uma vez, sou prova disso porque estava lá, que se fosse possível, voltaria atrás e viveria tudo de novo, porque foi uma época boa da sua vida.

Ela estudava muito. Acordava muito cedo para estudar. Seu pai estranhava, a mãe não fazia muito caso. Mas ela gostava. Ela adorava estudar. Disse-me, uma vez, que se "agarrava" nas matérias mais difíceis, para depois ir para as que ela gostava. Dizia que ia fazer engenharia civil. Porém, a gente tenta planejar algum futuro distante na nossa vida, só que as consequências do presente nos desviam para caminhos jamais imaginados.

Engravidou e casou-se cedo. Passou a viver o mundo do marido e perdeu suas amizades. Não perdeu as irmãs, que, sempre unidas, estiveram e estão ao seu lado. Seu primeiro filho foi muito mimado. O que, futuramente, rendeu muitos problemas. Teve outro filho, mas este não resistiu. Nasceu cedo demais, assim como a mãe, aos oito meses, mas não conseguiu permanecer na vida. Ouvi dizer que ele nasceu mesmo pra isso, para morrer, porque não havia criança mais linda do que ele. Teve uma filha, por fim, que ela aprendeu a não estragar. Porém, a moça caçula ficou deficiente em várias coisas. O filho sugou muito a atenção dela, e ela, numa atitude de erro desesperador, cegou os olhos e não viu o que faltou para a filha.

É uma mulher muito inteligente. Vários diplomas na mão, mas o sonho de ser engenheira civil não passou disso. Um sonho. Tem vários problemas. Falo de doenças. Sem contar em ter que aturar as pessoas da sua casa, sempre lhe trazendo problemas e problemas da rua. É uma pessoa cansada. Carregou por demais muito peso durante a vida. Carregou mais pesos do que o seu corpo suporta. E ainda os carrega.

Talvez você ache que ela não é feliz. Mas ela tem um pedacinho de felicidade, abrigado num pedaço do seu coração, ou melhor, no maior quarto da casa, naquela cadeirinha sempre olhando para a televisão. O seu bebê, antes seu pai.

Ainda vejo sim, a felicidade ali. Refletida naqueles seus olhos escuros e cansados. Ela acha a sua felicidade olhando para os olhos azuis e dopados de um homem que já foi corajoso, que já foi guerreiro e muito inteligente, mas que hoje reflete apenas as loucuras de uma vida, que hoje não passa do seu bebê. Ele é sua fortaleza.

Ela sofreu. E venceu.


MarinaV.


Para minha tia, Berta Lucy, demonstrando toda a admiração que tenho por ela.