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quinta-feira, 8 de julho de 2010

Triste fim de Clara


Esqueça. Esqueça. ESQUEÇA! Tire da sua inútil cabeça, tire sua inútil! Você não passa se uma vagabunda... Isso mesmo. Uma puta desqualificada, que apenas se ilude em cima de um homem que lhe jura amor, mas que no fundo apenas se contenta em te pagar em troca da ilusão de um carinho. Não derrabe lágrimas inútil, sua imbecil!! Não chore suas lágrimas indignas, suas lágrimas de um passado tão distante e mal vivido. Tudo é culpa sua, Clara, culpa sua...

Aonde me vejo agora? Tenho uma Ferrari para cada dia da semana, compro quadros caríssimos para enfeitar as paredes inúteis desse chiqueiro em que vivo. Compro compulsivamente, gastando o dinheiro deste otário que agora deita ao meu lado, sobe essa sua mão imunda de dinheiro pelas minhas pernas, me chama de "gostosa" e acha que eu vejo vantagem. Que imbecil! Mas eu aceito, passe essa sua mão enriquecida aonde quiser, sua puta está aqui se oferecendo. Suba e desça sua língua pelo meu corpo, não me importo. O amor se foi pra mim. O meu amor... se foi... pra mim...

Aonde me vejo agora? Antes, apenas uma adolescente como outra qualquer, se não fosse pela minha arrogância e egoísmo, como outra qualquer... Indo para seu primeiro dia de aula da universidade, aonde conheci ele. O amor...Ele é incrível. Se esbarra com a gente por acaso na vida, nos oferece oportunidades de cedermos o nosso eu para vivê-lo, e eu, esta puta imbecil, joguei todas fora. Estou pagando minha conta agora. Vamos, ordinário, me morda, pegue nas minhas pernas e sinta cada milímetro do meu corpo, enquanto eu ignoro a existência de cada milímetro do seu.

Aonde me vejo agora? Cadê aqueles olhos castanhos que me motivavam? Aqueles braços que me apertavam contra seu corpo, me fazendo sentir seu perfume maravilhoso? Perdi meu colo de consolo, perdi meu olhar de motivação, perdi o único beijo que soube realmente me tocar, perdi o único amor que soube realmente me amar. Miserável! Me jogue nessa sua cama inútil, me leve ao chão! Isso mesmo, me chame de puta, me bata! Eu pago a sentença, eu aceito a sentença.

Aonde me vejo agora, meu amor? Quem me dera se desse tempo de voltar atrás... E como eu iria gostar. Sentir de novo a brisa do mar naquela praia, te beijar e rolar na areia como naquele dia, me lembrar das loucuras de amor que você fazia, que eu movia apenas para preservar meu ego. Ele não tinha lá boas condições financeiras, e eu o rebaixava por isso. Julgava-o incapaz de me dar presentes caros, e quando menos esperava, lá estava meu colar de pérolas, meus brincos de diamantes, os vestidos luxuosos, as bolsas... Dinheiro... Sinto o cheiro de dinheiro ao lado desse velho que se deita perto de mim, que beija meu rosto e diz que eu "mandei bem"... E odeio o cheiro.

Aonde me vejo agora? Me chamo Clara. Clarice Oliveira Dantas. Aprendi francês, inglês e espanhol. Fui mimada o suficiente para ser burra, fui idiota o bastante para fazê-lo sofrer. Mas ele me chamava de Clara, porque eu era "límpida, leve e distante", como as claras nuvens que ficam no céu. Isso me faz rir... Não de alegria, de ver graça, mas de desgosto... Não havia ninguém mais límpido que ele, mais leve que ele, e tão perto de mim do que ele... Que ironia. Cuspi na minha felicidade. Joguei tudo para o alto e atirei no escuro. E o tiro acertou o alvo. "Clara Branca. Clarice Oliveira Dantas Branco. Você gostaria de ter meu nome no seu?" Ah, meu bem... Como eu gostaria de voltar...

Aonde me vejo agora? Ao lado de um idiota, derrabando lágrimas que ele julga de prazer, mas que são de profunda dor. Quero partir dessa vida, eu tenho péssimas lembranças! O que eu fiz, o que eu fiz?! Destruí minha alegria, meu único amor, minha razão de vida. Eu quero a dor da morte, eu mereço tal dor. Não, mereço dor pior. Tenho que permanecer viva, continuar sendo uma miserável qualquer, a puta deste ricaço, aturando as noites com ele ao lado, tirando a minha roupa como se eu fosse prêmio e deitando nessa cama, nesta maldita cama!!!

Apague, delete, destrua essas lembranças! Esquece aquele dia, esquece a maldita arma, esquece a brincadeira!! Esquece imbecil!! "Você gosta de brincar com fogo, minha Clara?" Sai da minha cabeça perfume dominador, sai do peito dor enorme! Não me derrube, não deixe as lágrimas me deixarem no soluço... Não posso sentir dor por isso... Não posso... "Gosto do fogo, posso disparar o tiro?" Saiam da minha cabeça risos idiotas, sai da minha cabeça som de bala, sai, sai, SAI!!!

É triste admitir os erros da vida. E este é o meu. Disparo agora este tiro na minha cabeça pensando na dor do peito dele ao sangrar aquele sangue vermelho, vermelho como a nossa paixão nas noites de verão, vermelho como as minhas lágrimas que agora escorrem.

Aonde me vejo agora? Caindo, como se cada segundo da queda demorasse uma hora, chego ao chão e sinto, pelo a última vez, o gosto... Daquele beijo... Da praia... Verão.


MarinaV.


Nota: Texto baseado no conto de Lygia Fagundes Telles, Apenas um saxofone. O nome Clara veio do livro Clara dos Anjos, de Lima Barreto. O sobrenome Oliveira e Dantas pertencem à duas amigas minhas, Carol e Bruna, respectivamente.

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